quarta-feira, abril 24, 2024

TODO ESTE NOVO É COISA VELHA!

Em várias oportunidades, seja em artigos meus ou em repasse do pensamento de outros, ambos postados na Lista do Blog Hipocrisia, tenho tentado mostrar que tudo a que assistimos hoje, seja no campo cultural, seja no campo político, tem como base o que foi proposto na segunda metade do século XIX. Tal assertiva provém de um momento recente em que percebi que os pensadores que são referenciados nos debates atuais tiveram o seu auge intelectual entre os anos 1850 e início dos anos 1900. É neste período que se expressam pensadores como Schopenhauer (1788-1860), Dostoievski (1821/1881), Darwin (1809/1882), Marx (1818/1883), Engels (1820/1895), Nietzsche (1844/1900), Freud (1856/1939),  Wittgenstein (1889/1951), Einstein (1879/1955), Mises (1881/973), entre outros, e um de quem vou tratar hoje, C. K. Chesterton (1874/1936).

Minha motivação é a reflexão principal que fica depois de terminar a leitura de “O Que Há de Errado com o Mundo”, de Chesterton, obra escrita em 1910. Nela, o autor trata de Feminismo, voto da mulher, educação, propriedade privada, família, imprensa, autoridade, formas de punição, escravidão, tudo em meio a críticas e considerações sobre sua contemporaneidade na Inglaterra da virada para o século XX.

Vou me limitar a reproduzir aqui apenas algumas passagens[1] mais significativas para a prova que o que estamos vivendo hoje de um modo tão intenso quanto amplo, geral, é apenas o ápice de um processo cujas bases estão há cerca de 150 anos atrás: Todo isto que pensamos ser “novo” é coisa muito “velha”, apenas com o design e as cores tecnológicas da moda. E esta não é uma constatação só minha. Em uma resenha que encontrei na internet, o autor[2] diz:

“Há boas evidências de que [o livro], na verdade, foi escrito hoje.

Nossa sociedade está experimentando exatamente a crise sobre a qual Chesterton nos alertou um século atrás. Nunca houve tanta disparidade entre os ricos e os pobres. Nossas famílias estão desmoronando, nossas escolas são um completo caos, nossa liberdade básica está sob ataque. Isso afeta cada um de nós. Como diz Chesterton, “Não só estamos todos no mesmo barco, mas estamos todos mareados.”

Leia e reflita sobre cada uma destas reflexões de Chesterton.

·         Todos temos consciência da loucura nacional, mas o que é a sanidade nacional?

·         A dificuldade em nossos problemas públicos está (...) que alguns homens oferecem, como estados de saúde, circunstâncias que outros não hesitariam em chamar de estados de doença.

·         Se você empreender hoje uma discussão com o jornal moderno, cuja posição política é oposta à sua, (...) você receberá ou insultos, ou silêncio.

·         Os homens inventam novos ideais porque não se atrevem a buscar os antigos. [Vou acrescentar um aprendizado que ganhei ao longo da vida que resumo no seguinte dito: “Tem sempre pato novo”. Os pensadores, em sua maioria, constroem unidades como “o povo”, “o homem/ser humano”, “a humanidade” como se fosse uma entidade coesa com história única. Mas a realidade é que a experiência se esvai com a morte e outro ser vem em seu lugar e vai se construir a partir de sua própria vivência, o que, na maioria das vezes, experimentar fazer o contrário do que fazem seus pais.]

·         [Esta é para os que sempre atribuem aos europeus uma superioridade que não se prova na prática:] O estatista inglês é subornado para não ser subornado. Ele nasce com uma colher de prata na boca, a fim de, mais tarde, não aparecer com uma no bolso.

·         Mesmo onde a imprensa é livre para criticar, ela só se presta à adulação.

·         A propriedade é tão somente a arte da democracia. Significa que todo homem deveria ter algo para moldar à sua própria imagem (...). Contudo, (...) sua expressão pessoal deve dar-se dentro de certos limites. A rigor, dentro de limites severos e até mesmo estreitos.

·         Conheci muitos casamentos felizes, mas nunca um compatível. (...) um homem e uma mulher, como tais, são incompatíveis.

·         O lar é o único lugar onde o homem pode cobrir o telhado com um tapete e o chão com telhas, se assim o desejar.

·         O Deus dos aristocratas não é a tradição, mas a moda, que é o extremo oposto da tradição.

·         Mas seja o que for, que os grandes senhores tenham esquecido, eles jamais esqueceram que sua ocupação é apoiar as coisas novas, as mais faladas entre os dignitários das universidades ou entre os atarantados financeiros. Assim estiveram do lado da reforma e contra a igreja, do lado dos Whigs e contra os Stuarts, do lado da ciência de bacon e contra a velha filosofia, do lado do sistema industrial e contra os artesãos, e hoje estão do lado do crescente poder do Estado e contra os ultrapassados individualistas. Em suma, os ricos são sempre modernos: esse é o seu negócio.

·         Uma aristocracia é sempre progressista, é uma forma de estar sempre atualizada. Suas festas terminam cada vez mais tarde, pois estão tentando viver o amanhã.

·         Sir William Harcourt, típico aristocrata, formulou de maneira bastante sensata que: “Todos nós [isto é a aristocracia] somos hoje socialistas”.

·         Pode ser que o socialismo represente a libertação do mundo, mas ele não é o que o mundo deseja.

·         A democracia em seu sentido humano, não é o arbítrio da maioria. Não é sequer o arbítrio de todos. Pode ser definida com mais correção como o árbitro de qualquer um. Quero dizer que ela está amparada naquele hábito de clube de aceitar que um completo desconhecido pode inevitavelmente ter algumas coisas em comum conosco.

·         A submissão ao homem fraco é disciplina. A submissão a um homem forte é apenas servilismo.

·         A objeção tacanha tanto a reis quanto a credos, chama-se tolice. Podemos nos guiar pela astúcia ou presença de espírito de um regente, ou pela igualdade e apurada justiça de uma regra. Mas é preciso ter um ou outro, caso contrário, não seremos uma nação, mas uma só barafunda.

·         Se a civilização realmente não consegue prosseguir com a democracia, a desvantagem é toda da civilização, não da democracia.

·         Logo ouviremos contar de especialistas separando letra e melodia numa canção, sob o pretexto de que uma atrapalha a outra.

·         O escravo bajula, o moralista integral censura. [Aproveito aqui para pegar um pensamento de Chesterton e usá-lo para explicar a adesão de profissionais – jornalistas como exemplo maior – às opiniões de seus empregadores. Ele observou que na defesa de seu sustento, as pessoas, por “lealdade”, simplesmente adotam as verdades “de seus empregadores”.

·         Se um homem é açoitado, todos nós o açoitamos. Se um homem é enforcado, todos nós o enforcamento. Numa República, toda a punição é tão sagrada e solene quanto um linchamento.

·         Esse brado de salvem as crianças têm em si a odiosa implicação de que é impossível salvar os pais.

·         A educação Moderna significa impor os costumes da minoria e desarraigar os costumes da maioria.

·         Até um selvagem seria capaz de ver que pelo menos as coisas corpóreas que são boas para um homem são muito provavelmente, más para uma mulher.

·         Suspeita horrível, que às vezes me vêm assombrar, a suspeita de que Hudge e Gudge tenham uma sociedade secreta, de que a briga que mantém publicamente não passa de um esquema combinado e de que a forma como eles perpetuamente fazem o jogo um do outro não é mera coincidência.

 


[1] Você encontra a íntegra do “extrato” em: http://www.sendme.com.br/EXTRATOS/ExtratoDeQueHaErradoMundo.htm

[2] Por Dale Ahlquist e tradução de Vinicius Oliveira. Ver em https://www.sociedadechestertonbrasil.org/o-que-ha-de-errado-com-o-mundo/