quarta-feira, julho 19, 2023

ONDE ESTÁ “A VERDADE”?


Contou Fernando Pessoa: 
"Encontrei hoje em ruas, separadamente, dois amigos meus que se haviam zangado. Cada um me contou a narrativa de por que se haviam zangado. Cada um me disse a verdade. Cada um me contou as suas razões. Ambos tinham razão. Ambos tinham toda a razão. Não era que um via uma coisa e outro outra, ou um via um lado das coisas e outro um lado diferente. Não: cada um via as coisas exatamente como se haviam passado, cada um as via com um critério idêntico ao do outro. Mas cada um via uma coisa diferente, e cada um portanto, tinha razão.
Fiquei confuso desta dupla existência da verdade."

Ao longo da vida construí uma percepção de que quando muito se fala em algo é porque muito do algo falta. Nos últimos tempos muito se fala em democracia e em “defesa da democracia”. Se muito se está a ressaltar o valor da democracia é pela única razão de que ela está em falta, do contrário não haveria motivo para tanto nela se falar. Se ela precisa ser defendida, fica evidente que ela está sendo atacada.

Entretanto, diferentemente do conceito de democracia para o qual pode ser dada uma definição – ao sabor da visão ideológica de quem a faz, seja dito - e podermos então apontar com razoável assertividade se em um país se pratica ou não os princípios democráticos, para conceituar “a verdade” temos alguns problemas que precisamos considerar.

Nos últimos tempos só ouço de todos os cantos e vozes que é preciso que "os outros" saibam e digam "a verdade". Ora, se é isso, então é porque estamos rodeados de mentiras, ou inverdades (aquilo que não é uma mentira, mas também não é uma verdade!). Mas o que está acontecendo, pois TODO MUNDO SABE A VERDADE SOBRE TUDO, MENOS EU!!!???

De minha ótica, a história da humanidade foi feita com mentiras e narrativas em egocêntrico proveito próprio, jamais por uma impossível "verdade" absoluta e, menos ainda, universal. Ao longo dos séculos, "a verdade" sempre esteve - e continuará estando - com o detentor do PHODER e com aqueles que lhe delegaram a procuração para os representar (o poder é sempre uma concessão temporária, ninguém o tem como patrimônio).

Em 2015, publiquei um texto sobre o tema onde apresento alguns argumentos para mostrar que “a verdade” não existe, e que, revisitado hoje, não tive uma palavra, frase ou parágrafo sequer para mudar ou retirar. Apenas observei que deixei de tratar com um pouco mais de detalhe um aspecto fundamental do problema: a temporalidade das “verdades”.

Neste julho/23, é fácil perceber isto observando as viradas de ponta-cabeça nas falas atuais dos integrantes do espectro “pro/regressista” que nos chegam quase todos os dias pelas redes sociais mostrando as "verdades" de “antes” e as de “agora”. "Um espanto!!!", exclamaria um antigo personagem de Jô Soares. Um exemplo. Acabei de ver (19/7/23) uma explicação sobre o pedido da PGR para que seja emitida uma “ordem” para as plataformas entregarem a lista com todos os dados dos milhões de seguidores de Bolsonaro: “A PGR SÓ QUER MEDIR O ALCANCE DAS POSTAGENS EM REDES SOCIAIS!!!”. 

Tempos estranhos os que estamos vivendo. Nebulosos, escuros e ameaçadores.  

Esta postagem é apenas uma introdução para o artigo mencionado. Para conhecer meus outros argumentos, acesse: https://pfvogel.blogspot.com/2015/08/a-verdae.html

 

(*) Cometi um erro (verdae) ao nomear o arquivo desta postagem. Não dá para corrigir. Então, desconsidere e clica.

 

Um comentário:

  1. Paulo , suas colocações são " verdades " percepções lógicas desse tempo onde os " distraídos e desavisados " continuam com suas mentes sabe-se lá esperando o que ...
    Seus textos são muito bons , obrigada por nos permitir boa leitura 👏
    Ana Cristina Barbeito de Pinho

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