sábado, abril 25, 2020

NOVES FORA HIPOCRISIAS...

Tenho poucas qualificações além de ser um observador da vida, dos seres humanos e cultivador de um gosto especial por projetar consequências futuras de fatores e atos do presente. Isto posto e, portanto, do alto da minha ignorância do que se passa nas alturas do poder, vou registrar minha tese sobre o imbróglio Bolso/Moro ou Moro/Bolso, como prefiram.

Desde os primeiros dias da era digitrônica, quando ela ainda engatinhava nos idos da década de 90, já mostrava seu potencial de interferir no modus operandi das relações humanas e dos humanos com as "entidades" da civilização em todos os níveis de atuação. Um dos exemplos disto é a profunda alteração na dinâmica política em função do "encurtamento dos tempos" que ocorreu nestes últimos 30 anos. Quando antes tudo demorava um tempo favorável à digestão dos acontecimentos, hoje o tempo que dura é apenas uma questão de quão larga é a banda de transmissão medida em gigabits por segundo. Sendo mais específico, a demora na circulação da comunicação, nos dava certa garantia de que a informação, antes de provocar reações, tinha grande probabilidade de ser ingerida, gerida e dela extraído um extrato menos venenoso, menos danoso, e mais fortalecedor de nossas próprias ideias e princípios.

Em nossa era digitrônica, o Ministro faz uma coletiva de imprensa em que antes mesmo de seu término já se espalham por todas as mídias interpretações, considerações e projeções tão díspares quanto os interesses de seus propagadores - cidadãos, políticos, empresários, jornalistas (principalmente), blogueiros, etc.

Somadas as falas, as contra-falas, as fofocas, as fake news e outros ingredientes midiáticos duvidosos, escusos, e tirados os noves, até aí o resto que sobra é sempre o mesmo: uma grande hipocrisia.

As questões relevantes, o que realmente compõe o arcabouço dos acontecimentos, as reais motivações de cada ator neste grande jogo de poder não-digital, sem heróis pré-configurados, sem armas totalmente conhecidas, sem regras de pontuação e sem saber o que determina o como e quando o jogo acaba, simplesmente não são postas à evidência do maior número de cidadãos. Seria contra-produtivo!

Quais então seria tais questões? Temos nós, incautos e manipulados cidadãos-eleitores, possibilidade de conhecê-las? Possível é, mas não é fácil. Por isso vou expor algumas observações para organizar meu pensamento e tentar ajudar meu leitor a fazer mesmo.

Desde muito certas coisas vindas de Moro me incomodam. Como acontece quando nos identificamos com o que faz/pensa alguém, somos psicologicamente induzidos a fingir que não relevamos coisas que... hum... "é melhor não pensar nisso". Lembra da divulgação da conversa entre Lula e Dilma sobre a nomeação para ministro da Casa Civil? Não ficou um cheirinho de merda no ar? E a omissão recente de Moro sobre a obstrução do direito de ir e vir cometidas em obediência a ordens de governadores e prefeitos? Outros "eventos" estranhos ocorreram, mas saí de minha cegueira voluntária depois da forma imoral que ele escolheu para marcar a comunicação de seu pedido de demissão. Enquanto ele cobrava do Presidente uma razão "técnica" para exonerar o Diretor Geral da PF, ao mesmo tempo ele não dava sua real razão para intencional e claramente criar uma crise política com graves consequências para o país. Qual sua intenção? Por que simplesmente não se concentrou em sintetizar os resultados de sua gestão, o que seria absolutamente justo, em lugar de fazer insinuações sobre pretensos interesses escusos de Bolsonaro? Para esse tipo de atitude, quando acontece conosco, classificamos o sujeito taxativamente como um tremendo mau-caráter.

O segundo aspecto importante a que devemos dedicar especiais reflexões é quanto ao grande, monumental feito realizado por Bolsonaro a partir de seu primeiro dia de governo: o desmonte do establishment (*), anglicanismo horroroso que Paulo Guedes gosta de usar. Chamo sua atenção para avaliar com extremo cuidado e à luz de princípios de uma democracia plena, a atuação de Ministros do STF que têm se arvorado iniciativas de completo ataque à Constituição, como, por exemplo, Celso de Melo interpelando Rodrigo Maia sobre as razões de não colocar em pauta os tantos pedidos de impechment que foram protocolados na Câmara. Respondi assim, em rede social, a comentário manifestando a retirada de apoio a JB: "Só a coragem destemperada de JB para revirar o status quo da política então vigente. Quem o acusa está esquecendo que há um jogo político de alta resistência que: 1) faz tudo o que pode para minar o poder de ação do governo federal; 2) fazem de tudo para se refestelarem com as verbas que deveriam estar a serviço do país; e 3) não estão nem aí para todos nós". E acrescentei um "lembrem-se":
Mas aqui vou deixar uma outra pergunta: como estaria sua integridade moral, psíquica, fisiológica, mental, se estivesse no lugar dele, passando pelas mesmas pressões?

Um terceiro aspecto tem a ver com o valor pessoal que Bolsonaro me parece ter como sendo o maior que preza: a família. Não sem razão, portanto, levou para o Planalto seus 4 filhos, sendo que 3 deles políticos eleitos, cada um em uma esfera, cada um com responsabilidades de atuação na estrutura do poder executivo federal. Proteger qualquer um deles é o que ele faz e é o que a maioria de nós faria. Pelo menos até onde os preceitos morais de cada um não fosse ferido de morte. Dito isto, me acompanhe com vagar, porque vou fazer uma suposição a partir do fato incontestável de que o inquérito sobre "rachadinhas" no Rio de Janeiro, cujo protagonista principal é Fabrício Queiroz, um amigo pessoal de Flávio e Jair Bolsonaro, não anda, não chega a nenhuma conclusão final. 

É do "conhecimento" popular desde áureos tempos que a maioria dos assessores nomeados por políticos de cargos eletivos ou não, destinam, em princípio, 30% de seus salários para o político que o nomeou. Arrisco-me a deduzir que esta prática é uma, ou talvez a principal razão para que os salários de servidores públicos sejam na média o dobro dos salários da iniciativa privada para as mesmas funções e qualificações. Isto é razoável supor porque, do contrário, ninguém toparia ganhar 30% menos no serviço público quando poderia ganhar os 100% na iniciativa privada!!! Esta seria, na minha hipótese, uma prática que ao longo do tempo foi ganhando ares de "normalidade", a ponto de que novos integrantes, mesmo que íntegros como madre Tereza, com o passar dos meses e ganhando um salário não condizente com sua "abnegação pelo povo", cheguem à conclusão de que os "mais antigos" têm toda razão em praticar a "rachadinha" como justo complemento de renda. Na minha hipótese, portanto, talvez o problema do papai seja que entre os integrantes do poder isto sempre tenha sido normal, até que alguém use tal "desvio moral" como pretexto para atacá-lo. Dar uma gorjeta para o guarda é prática normal até o dia em que você é publicamente exposto tendo praticado tal ato. Sacou? No caso em pauta, como defender agora tal prática em tempos passados? Supondo, obviamente, que nos dias atuais a prática tenha sido no mínimo suspensa temporariamente.

Antes de encerrar, deixo a opinião de que a democracia precisa ser reinventada para lidar com os desafios impostos pela era digitrônica. Em particular aquelas que, como a brasileira e a americana, têm mandatos de 4 anos, com eleições intercaladas a cada 2 anos, dinâmica que impede projetos de longo prazo e favorecem a constante disputa pelo poder, levando, inevitavelmente, a pedidos de impeachment, independente de quem seja eleito, de quanto apoio tenha o governante, de quais seus níveis de acerto etc. É impossível um país ter estabilidade para se desenvolver se não puder agir com objetivos e metas de longo prazo. É inconcebível que a quase 3 anos da próxima eleição presidencial, esteja hoje em pauta em todas as mídias a doisputa de 2022!!! É insano ter diversos governadores que, em plena pandemia, estão em flagrante campanha para Presidente da República!!! 

Noves fora a hipocrisia, portanto, sobra o restolho, o inevitável lixo do jogo político, jogo do qual só participamos como gândulas, apanhadores de bola-fora de jogadas mal executadas! Entendeu a ironia?


(*) Significa "todos os que compõem a elite no poder".





2 comentários:

  1. Um jogo hipócrita "vaidade das vaidades" disputa de poder, autonomias, soberanias! Ofensas, discursos, ataques e defesas. tudo...tudo vaidade. Tudo que envolve poder expoe o melhor é o pior de cada um.

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    1. Você tem razão. Somos máquina de manobra para aqueles psicopatas dispostos a assumir o poder e oprimir os cidadãos de bem que pouco mais querem além de viver e sustentar os seus até que a vida o permita. Este é o "algoritimo" da vida contemporânea.

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